O tal do Dia dos Pais

Eu prometi a mim mesma que deixaria passar em branco. Numa tentativa frustrada de tentar ser forte em tudo - ou quase tudo - liguei pro pai, que está sofrendo com uma surpreendente hérnia a 500 quilômetros de distância. Uma vontade imensa de voltar a ser criança e  acreditar em máquinas instantâneas, dessas que te fazem ir de um lugar a outro em segundos. 


"Sobrevivi", pensei. Encorajo-me, envio um torpedo para um amigo que é pai e fico feliz. Logo o espírito do dia me pega novamente. Uma amiga, ou melhor, irmã de alma, escreve uma declaração pro seu pai, que há quatro meses partiu pro céu. Meus olhos se enchem d'água, lembro de outros amigos, que também perderam seus pais recentemente ou há mais tempo. Rezo por eles, "curto" seus comentários, atrevo-me a fazer parte desse momento inevitavelmente triste. Um deles é o meu sogro, que há 11 anos deixa meu marido com saudades a cada Dia dos Pais.

"Não vai dar", suspiro. Mas, vou em frente. Com um misto de saudade e compaixão. Lembro de quem não é pai legítimo, mas é pai presente, desses que tem muitos e muitos filhos. Que deixam suas próprias famílias de lado para pensar no outro. Penso nos pais que são pais de verdade, nos que deram a vida a alguém, mas por questões extras da vida, sequer conheceram os filhos. Ou aqueles pais e filhos que conviveram na mesma casa, mas infelizmente não se reconhecem. 

"Será que vai ser diferente?", questiono. O tradicional almoço acontece e eu me vejo ao redor de "pães", avôs, pais de primeira viagem, pais de várias gerações. Vejo com alegria os bons exemplos, embora meu inconsciente me lembre a todo instante que há todo tipo de pai; há todo tipo de gente.

"Perdão para eles", tento entender. Recordo-me de um documentário sobre ditadores que chocaram o mundo.  E, por mais óbvio que seja, assim mesmo me espanto: alguns deles tiveram pais ausentes ou agressores, o que explica - embora seja difícil ter explicação - tantas crueldades por parte desses líderes.

Olho para mim mesma e para o meu filho. Abraço-o mais forte enquanto ele adormece. Penso no que posso protegê-lo, nas limitações do autismo, em como driblar o especial com o desejo do simples. Ironicamente, o que ocorre com pais de crianças especiais. Olho para frente e vejo um marido que não podia ser melhor pai. Graças a Deus.

E assim chegamos a mais um Dia dos Pais. Prometi que seria diferente, mas foi a mesmice encantadora: o par de chinelos de papelão e a camisa com lixa colorida feitos na escola do filho. O lado comercial, as críticas ao consumismo, eu não me nego a enxergá-las - restrinjo a um almoço e a um par de sapatos novos de presente. Apenas não as vivencio. Tem um tal de Dia dos Pais muito mais amplo, que me atrai mais.



Comentários

  1. Depois de ler somente desejo agradecer por poder ler tuas palavras... Saudades de ti mais perto... Beijos amiga!

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  2. Existem alguns clichês que são inevitáveis e necessários... mas os sentimentos e os olhares.. esses sim dão o tom capaz de transformar qualquer clichê em algo surpreendente! Tudo depende de como você vê!

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