Viciados em conexão, desinformados ao extremo
Você, após um dia em que o seu feed de notícias
amanhece com as vítimas no Marrocos e na Líbia e anoitece com o novo elenco de A
Fazenda, não fica meio tonto? Se fôssemos medir informação por quilo, sem
nenhum exagero somos invadidos por toneladas a cada 24 horas. A infodemia –
excesso de informações – virou alerta da Organização Mundial de Saúde. Se ainda
duvida, consulte o “Data never sleeps” (DNS - dados nunca dormem). A
cada minuto, mais de 18 milhões de mensagens de texto são enviadas; 2,4 milhões de
buscas são realizadas no Google. O DNS atinge 63% da população mundial – cinco
bilhões de pessoas.
Tantas e tantas notícias, além de nos deixar atônitos, abrem
a porta para fake news. A humanidade sempre gostou de espalhar boatos.
Eu me lembro que, ainda no começo dos anos 2000, ajudei um cliente a desmentir
que tinha uma vaca geneticamente modificada dentro de suas fábricas. Deu um
trabalho danado buscar desmentidos de quem fora citado – uma universidade
norte-americana e órgãos governamentais brasileiros. Naquela época, as mentiras
se espalhavam por e-mails. Hoje, é ainda pior, temos mais canais de comunicação.
Somos oito bilhões de
produtores de conteúdo pelo mundo. Todos temos um aparelho celular, que
fotografa, filma, tem acesso à Internet para as redes sociais e, de vez em
quando, até é usado para telefonemas. Com isso, os conteúdos não verdadeiros
vão diminuir?
Aí, depende de um caminho muito longo. Na Educação, já
temos, em sala de aula, debates sobre como detectar fontes confiáveis e
desconfiar de títulos longos e adjetivados, depoimentos exageradamente
emocionados. Nos veículos de comunicação, passamos a ter editorias só para
desmentir coisas absurdas.
Mas, então, o que faz as pessoas acreditarem em Terra plana,
por exemplo?
Essa resposta é ainda mais triste. Muitos dos que creem, na
verdade, querem acreditar. É como se isso fosse um alento. O mundo todo está
errado, menos eles. São discursos com bases mais emocionais, coléricas e menos
concretas. Facilmente reconhecemos parentes, empenhados em nos convencer de
coisas sem o menor embasamento. Bem lá no íntimo, eles queriam que tudo aquilo
fosse verdade.
Cada vez mais há alertas para ficarmos menos conectados. A
hiperconectividade nos faz trabalhar, ouvir música, olhar as redes sociais – ao
mesmo tempo. Segundo a NordVPN, os brasileiros passam, em média, 41 anos
na Internet. São 91 horas online por semana. Todo mundo meio que se
sente cobrado em estar ativo nas redes sociais, tem medo de ser mal avaliado no
ambiente digital e se compara com os outros ao redor. Ninguém quer ficar
publicando que não teve um dia bom no trabalho, que brigou com a mãe e que fez
feio na reunião de condomínio. Essa pressão toda causa mal à saúde: insônia,
falta de concentração, depressão e coisas piores.
É por essas e outras que a Sociedade Brasileira de Pediatria
vem implorando menos telas para crianças e adolescentes. Estudo da McAfee
de 2022 revelou que crianças e adolescentes brasileiros são os que mais usam
aparelhos celulares no mundo. Já existem pousadas cujo diferencial é não ter
Internet em quartos dos hóspedes. Há programas de detox para utilização
de aparelhos eletrônicos.
Estamos viciados. E desinformados.
Comentários
Postar um comentário