Não estou disposta

Não se tem disposição para trânsito. Ou filas. Ou elevadores. Ou conversas corriqueiras. Ou sequer para a chuva. Isso se chama impaciência. Ou ‘um dia daqueles’. A graça não acorda com você. Simples assim.

Tem-se disposição para a preguiça. Para a indulgência. Para o nada. Para o programa de televisão ‘vazio’ – às vezes, cheio de personagens, diálogos, mas impressionantemente sem mensagem alguma.

O tal do consumo rápido. O fait divers, de Roland Barthes. A desconexão total, a notícia sem sentido. Mas que te faz ficar na inércia, sem pensar, sem sentir pressão de nada. Uma fuga? Provavelmente.

Não há disposição para o preconceito. De qualquer origem. Para a corrupção. Para a maldade. A rasteira. Outra ironia. Porque há muitos dispostos a tudo isso. E, esses monstros às vezes não estão do seu lado. Estão dentro de você. O pensamento que não se concretiza. Mas que você , muitas vezes, não entende porque outros concretizaram. Difícil limiar. 

Nunca há disposição para a política – entenda-se por política o significado completo. Para sorrir sem vontade. Aceitar o inaceitável. Tolerar o intolerável. Ouvir o que deveria ser impronunciável. É o não à permissão.

Às vezes – pasme – não há disposição para muitos risos, festa, alegria descompromissada. Porque, simplesmente, o momento não está disposto. Uma perda. A morte. É assim.

Em sentido inteiramente diferente, a disposição vem para o Carnaval, a folia, a risada fácil, os amigos. Para tudo que faz a gente não pensar no amanhã. Isso se chama presente. Valioso.

Estejamos dispostos. A qualquer tempo. Com quem quer que seja. Ao ruim e ao bom. À vida. "Como ela é", diria Nelson Rodrigues. Convite? Segredo da vida? Quem vai saber...




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